Provavelmente a pergunta mais importante para quem está vendendo ou comprando um animal vivo para o abate é: “quanto este animal em negociação vai render em carcaça após ser abatido?” O que se busca no animal de corte é o máximo de carcaça e o mínimo de não-constituintes da carcaça, ou seja, busca-se o máximo de rendimento. Entende-se por rendimento a quantidade de carcaça gerada pelo animal vivo após o seu abate, ou seja, o rendimento é quanto do animal, em termos relativos, é constituído de carcaça. A característica produtiva mais importante do animal de corte é, portanto, o seu rendimento de carcaça.
Determinação do rendimento
O peso do animal na balança denomina-se peso vivo (PV) e é formado por uma fração abiótica e outra biótica. Este último é o verdadeiro peso dos tecidos que compõem o animal, enquanto o primeiro não é constituinte tecidual do animal, consistindo de conteúdo gastrintestinal (água, ingesta, digesta e fezes) e de líquido da bexiga e vesícula biliar.
Neste sentido é que o animal antes de ser abatido deve passar por um período de jejum hídrico e alimentar.
Após o abate, o trato gastrintestinal (TGI), a bexiga (B) e a vesícula biliar (VB) devem ser esvaziados e lavados para a obtenção do peso corporal vazio (PCV), que será estimado subtraindo-se do peso vivo ao abate em jejum (PVAJ), os pesos referentes ao conteúdo gastrintestinal, da bexiga e da vesícula biliar.
Após ser obtida, lavada e escorrida, a carcaça é pesada para se obter o peso da carcaça quente (PCQ). A partir daí, determina-se o rendimento da carcaça quente ou verdadeiro (RV) e o rendimento biológico (RB).
PCV = PVAJ – (conteúdo do TGI + B + VB)
Posteriormente as carcaças deverão ser acondicionadas em sacos plásticos e, finalmente, transportadas para uma câmara frigorífica a 4°C, onde permanecem penduradas pelo tendão calcâneo do jarrete (tendão do músculo gastrocnêmio) em ganchos por um período de 24 horas,quando o centro térmico da perna atinge 4°C . Decorrido esse período, a carcaça é pesada para se determinar o peso da carcaça fria (PCF) e, em seguida, será determinada a perda de peso por resfriamento (PPR) e o rendimento de carcaça fria ou comercial (RC).
RENDIMENTOS E PERDA
RV = (PCQ/PVAJ) x 100
RB = (PCQ/PCV) x 100
RC = (PCF/PVAJ) x 100
PPR = (PCQ – PCF)/PCQ x 100
Embora o rendimento biológico seja o que melhor representa os componentes da carcaça ao eliminar as variações influenciadas pelo conteúdo abiótico, o rendimento verdadeiro é o mais utilizado pelos produtores, enquanto o comercial é o mais praticado pelos frigoríficos e mais importante para a cadeia produtiva da carne ovina e caprina.
Na comparação de rendimentos, é necessário saber o que foi considerado como carcaça ou não, pois a gordura perirrenal e pélvica, os rins, a cauda, a cabeça e a pele, por exemplo, podem ser ou não, em função das tradições de mercados, considerados como constituintes da carcaça.
Fatores que influem nos rendimentos
Vários fatores, ligados ao animal e ao meio-ambiente, podem afetar o rendimento de carcaça dos animais, com destaque para:
A) Tempo de jejum alimentar O jejum líquido deve ser de 16 h e o sólido de 24 h. Tempos muito superiores a estes resultam em desidratação e perda de tecido do animal, principalmente o adiposo, podendo alterar o rendimento de carcaça e causar efeitos prejudiciais à qualidade das carcaças. Contrariamente, tempos muito curtos podem superestimar o PVAJ e, por conseguinte, diminuir o rendimento da carcaça. Estudos australianos demonstraram que cordeiros com jejum de 2, 4, 6, 8, 12, 24, 48 e 72 h, a perda de PV foi de 2,0, 2,5, 3,0, 4,0, 5,0, 7,0, 10,0 e 12,0%, respectivamente.
O efeito do jejum sobre a perda de peso vivo e, portanto, sobre o rendimento de carcaça depende do tipo de alimento previamente consumido pelo animal a ser abatido. Animais alimentados com alimentos fibrosos e de baixa digestibilidade, como os volumosos, normalmente apresentam um rendimento de carcaça menor que aqueles alimentados com menos fibra e de maior digestibilidade, a exemplo dos concentrados, porque há perda de conteúdo do TGI mais lento e consequentemente maior PVAJ, mesmo que submetidos a igual tempo de jejum.
B) Idade e peso vivo do animal O peso vivo associado à idade tem sido usado com muita freqüência como indicador do rendimento de carcaça. A cria recém-nascida tem relativamente mais cabeça e membros, mas a medida que cresce, surgem ondas de crescimento progressivas das extremidades do corpo para o tronco e particularmente para a região dorso-lombar (crescimento centrípeto) de forma que com o aumento do peso vivo, as regiões corporais de crescimento muito precoce, como os membros e cabeça, diminuem, enquanto que regiões mais tardias, como aquelas do tronco, aumentam proporcionalmente. Como a cabeça e as extremidades não são constituintes da carcaça e elas são, em termos proporcionais, maiores em animais mais jovens, espera-se que estes tenham menor rendimento de carcaça que aqueles mais velhos, com maior proporção de regiões do tronco, que são constituintes da carcaça. Por outro lado, quanto mais jovem for o animal, menor é a proporção do trato gastrintestinal (TGI) e de seu conteúdo, de modo que dois animais de mesmo peso, o mais jovem terá, provavelmente, maior rendimento de carcaça.
O mesmo princípio serve para os animais lactantes, de menor TGI e com alimentação mais digerível, em relação aos animais desmamados, de maior TGI e alimentação menos digerível. Da mesma forma que ocorre com a composição regional, a composição tecidual da carcaça sofre efeito do peso vivo. A ordem de prioridade de deposição de tecidos no corpo e, por conseguinte, na carcaça, é em primeiro lugar o tecido ósseo, seguido pelo muscular e por último o adiposo. O tecido ósseo pára de crescer no animal ainda jovem, o muscular encerra seu crescimento quando atinge a maturidade, enquanto o gorduroso continua a ser depositado continuamente durante toda a vida do animal. Assim, animais de mais idade e/ou de maior peso, por possuírem uma maior quantidade de gordura que animais mais jovens e/ou menos pesados, deverão apresentar maior rendimento de carcaça.
C) Sexo do animal Em geral, a proporção de gordura nos pequenos ruminantes é menor nos machos inteiros, intermediária nos castrados e maior nas fêmeas, enquanto que a proporção de músculos é maior
nos machos inteiros, intermediária nos castrados e menor nas fêmeas, provavelmente porque a ação do hormônio masculino, testosterona, promove um crescimento muscular e esquelético mais acentuado, resultando em carcaças mais magras e com maior musculatura nos machos inteiros em relação aos machos castrados e fêmeas. Assim, como o crescimento muscular é temporário e o da gordura é contínuo, o rendimento de carcaça na fêmea é maior que no macho castrado e no macho inteiro é menor que no castrado, provavelmente pela maior proporção de tecido adiposo para uma mesma idade e peso vivo.
D) Frame size Animais com o tamanho da estrutura corporal menor, por serem mais precoces no crescimento e terminação, terão relativamente mais gordura corporal e, assim, apresentam normalmente maior rendimento que animais com biótipos maiores.
E) Condição corporal Em geral, animais bem condicionados nutricionalmente, com elevado escore de condição corporal, têm rendimento mais elevado que animais mais magros, haja vista que a condição é determinada pela quantidade de gordura depositada no animal.
F) Apêndices corporais Animais lanados, os pernaltas, os chifrudos, os com caudas e os inteiros em relação aos tosquiados, aos não-pernaltas, aos mochos, aos sem cauda e aos castrados, com mesma idade e peso, geralmente apresentam menor rendimento de carcaça.
G) Tipo zootécnico ou econômico Animais tipo corte, quando comparados a animais tipo leiteiro e mistos, quando bem alimentados apresentam, como é típico para esse tipo, uma massa muscular e um acabamento superior, que os levam a apresentar um maior rendimento de carcaça.
Carcaças ovinas e caprinas – Obtenção, Avaliação e Classificação
Marcílio Fontes Cezar
Wandrick Hauss de Sousa